Os Dias (da Cunha) do Sporting
O Sporting vive um momento agitado da sua história. A agitação, aliás, tem sido um facto recorrente na vida do clube e até pareceria mal se os 100 anos fossem comemorados num clima de paz e amizade (ironicamente o nome do pavilhão onde as equipas de andebol e de futsal dos leões costumam realizar os seus jogos em casa). Como adepto e sócio do Sporting confesso que continuo sem saber quem apoiar. Por isso, lanço apenas algumas notas soltas que me ocorrem, esperando ficar (eu próprio) mais esclarecido, no fim do texto.
Em primeiro lugar, o que dizer dos últimos 10/12 anos da vida do Sporting, isto é, do “projecto Roquette”? Se, como dizia o neto do fundador do clube de Alvalade, o objectivo do projecto, que passava pela criação da SAD e de um modelo de gestão empresarial, era assegurar a sobrevivência do Sporting e a responsabilização dos administradores em caso de maus resultados (desportivos e financeiros), não restam dúvidas de que o projecto falhou. O Sporting tem sofrido cada vez maiores problemas financeiros e, que eu saiba, nenhum administrador foi punido por isso. Muitos deixaram Alvalade, mas pelo seu próprio pé, não por punição pelo mau trabalho.
Quanto à vertente desportiva, como analisar? Roquette tinha prometido que o Sporting ia passar a ganhar três em cada cinco campeonatos e tinha condições para se tornar num dos maiores seis clubes europeus. O primeiro objectivo pareceu poder ser cumprido, com os títulos de 2000 e 2002, mas depressa se perdeu a dinâmica vencedora. Do segundo nem vale a pena falar, é mais uma tirada à Luís Filipe Vieira, entre uma sande de coirato e uma mine, que outra coisa. Basta ver as participações do Sporting na Liga dos Campeões, teste obrigatório para quem pretende ser grande. Para o sucesso do projecto desportivo muito contribuiria a firme aposta nas escolas do clube, indiscutivelmente as melhores do país. O Sporting continua a produzir talentos, mas cada vez os aproveita menos. Simão, Quaresma e Ronaldo, por exemplo, apenas jogaram na equipa principal um ou dois anos, antes de serem vendidos, por preços claramente abaixo do seu valor potencial. Para além disto, nunca houve uma linha coerente no projecto desportivo. Basta ver o número de treinadores e responsáveis pelo futebol que passaram por Alvalade na última década.
A obra feita reflecte-se naturalmente no estádio e na academia. Em ambos o Sporting consumiu imensos recursos financeiros, que, no entanto, proporcionaram um claro salto qualitativo na modernidade do clube. O estádio, com mais ou menos escárnio, derivado de mais azulejo e menos cadeira cor-de-laranja ou azul, é um dos melhores da Europa. Os elogios vindos de fora, de quem não tem nada a ver com as rivalidades locais, comprovam isso mesmo. Soares Franco afirmou que o Sporting teve muito menos ajuda financeira estatal e municipal que o Benfica e o FC Porto. Não sei se é verdade, mas, atendendo ao que se passou no Mundial de sub-20, em 1991, acho que é bem capaz de não ser mentira. Quanto à academia, é óbvio que o Sporting dispendeu muito mais dinheiro que os seus rivais. O FC Porto, como é sabido, não tem um centro de estágio próprio, antes utiliza um que é propriedade da Câmara de Vila Nova de Gaia. O Benfica, cujo centro de estágio está a ser construído à média de um tijolo por dia, terá um complexo muito mais pequeno que o de Alcochete, como revelou um dirigente encarnado há uns tempos.
O grande motivo de polémica do momento está ligado à venda ou não do património imobiliário não desportivo do Sporting. A venda é contrariada por muita gente, mais ou menos ilustre, mas apoiada por outra facção, na qual se destacam José Roquette, Miguel Ribeiro Telles e José Eduardo Bettencourt. Percebendo pouco ou nada de gestão, algumas dúvidas colocam-se-me. Vender algo significa que deixa de ser nosso, ganhamos o dinheiro acordado no negócio e nada mais, perdemos todo o poder sobre o objecto. No futebol português o que mais existe são casos assim, em que se vende tudo e mais alguma coisa para se resolver problemas imediatos. Quando esse dinheiro acabar, o que resta? O que se vende então? Segundo sei, o projecto para a zona prevê a criação de muitos edifícios, para habitação e escritórios. O Alvaláxia, então, passará a ser o local comercial mais forte da zona. Não será então uma boa fonte de receitas para o Sporting?
Finalmente, Dias da Cunha. O ex-presidente do Sporting tem vindo a opor-se ferozmente aos seus antigos parceiros de direcção, nomeadamente ao antecessor, José Roquette, e ao sucessor, Filipe Soares Franco. No entanto, julgo que Dias da Cunha, pelo seu passado de contradições, pouca consideração merecerá hoje em dia. Recordo três exemplos:
- Na época passada, Dias da Cunha insurgiu-se contra muitos sócios e adeptos leoninos, apelidando-os inclusivamente de escória, depois destes contestarem José Peseiro após um horrível início de época. Esse mesmo Dias da Cunha tornou-se conhecido de grande parte do universo sportinguista em 1999/2000, depois de um U. Leiria-Sporting, em que os leões cederam um empate, mas mantendo-se no topo do campeonato que, aliás, vieram a ganhar. Razão para essa fama súbita: críticas públicas e fortes ao então treinador, Inácio, e à equipa, que provocaram incómodo no clube. Primeiro telhado de vidro.
- Dias da Cunha defendeu até ao fim José Peseiro, para mim o pior treinador do Sporting nos últimos 20 anos. Aliás, demitiu-se da presidência após a resignação do técnico. Em 2004, o mesmo Dias da Cunha demitiu ou pactuou com a demissão de Fernando Santos, de forma indigna, após uma digressão de fim de época à América do Norte. E o engenheiro tinha feito mais 12 pontos no campeonato que Peseiro. Segundo telhado de vidro.
- Pressionado pelos adeptos do Sporting para demitir José Peseiro, Dias da Cunha nunca vacilou, vincando que o clube era dirigido de dentro e não de fora. Tudo óptimo! Mas foi na presidência de Dias da Cunha que o Sporting voltou atrás na intenção de contratar José Mourinho, devido às pressões da Juve Leo. Terceiro telhado de vidro.
Seja como for, uma coisa é certa. Em crise, em falência, em hecatombe, nunca o Sporting teve tantos candidatos a candidatos e tanta gente interessada em entrar no clube. Resta saber quem será o mais habilitado para conduzir o clube nesta altura decisiva. Confesso que ainda não sei.
5 Comments:
Caro Jorge, devo dizer que ainda não tenho candidato definido, também. Embora tenha assinado um documento de apoio a Guilherme Lemos, mas isso foi por simpatia, quando me preparava para comprar os bilhetes para o SCP vs Paços de Ferreira.
É bom haver um certo número de candidatos, pois promove a discussão interna. Em contrapartida, pode dividir o clube e os sócios.
Penso que a solução não passa pela venda de património, na medida em que seria uma medida de curto prazo e não traria mais do que ainda mais problemas para o Sporting a médio/longo prazo.
Deixo também aqui a minha nota de repúdio pela atitude do nº2 do Paços de Ferreira em Alvalade e passo a explicar porquê... Quando o Sporting atacava, o árbitro tomou uma decisão que no meu entender foi errada e eu com o nosso conhecido Gilberto Mandamil não nos privámos de dizer das boas do árbitro e do fiscal de linha, que tinha uma careca e corria à panasca. Nestas circunstâncias, o Sr. Nojento de Merda, o nº2, vira-se para nós e diz isto: "Estejam caladinhos cabrões do caralho". Uma péssima atitude e que merece uma nota de repúdio da minha parte e penso estar a falar em nome do Gilberto também.
Vota Dias Ferreira.
Amigo Porfírio, o que é que tu sabes que eu não sei? Estás a ser sincero ou é a tua costela de lampioun a falar?
Amigo Jorge, infelizmente não sei nada de mais.
A proposta do Dias Ferreira, obviamente não passa de uma brincadeira pró-caos.
Não costumo apreciar maomés cheios de telhados de vidro.
É estranha a atitude de Dias da Cunha ao criticar Soares Franco e o seu "pupilo" Ernesto Silva Ferreira. É também estranho ver o Luis Duque a apoiar(indirectamente) o projecto mais próximo da continuidade,visto ter criticado, no início da época, a gestão de um grupo onde se incluiam, entre outros, Soares Franco.
Não estou suficientemente esclarecido para dialogar sobre os prós e contras da alienação de património mas, acima de tudo, custa-me ver na presidência do meu clube alguém que afirmou que "o benfica é maior que o sporting" e que pretende acabar com grande parte das modalidades que deram nome à instituição(com "i" minúsculo, senão estaríamos a falar do outro lado da 2ª circular).
Não posso elogiar nem criticar Dias Ferreira como gestor ou líder, mas admiro-o pela sua frontalidade e determinação em defender o S.C.P. . Para além disso o LFV diz que ele é equivalente ao Vale e Azevedo, o que me leva a pensar o contrário.
Espero ficar mais esclarecido após a assembleia geral de amanhã.
P.S. : Não tenho participado activamente na blogosfera nos últimos meses, mas espero regressar em breve. Guardo mais uma linha para elogiar o trabalho do Paulo Bento e desejar que ele corte o cabelo em breve, pois um treinador com o seu talento não merece ter um risco ao meio daqueles.
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