28 outubro, 2005

Onde raio está o novo Mourinho?

É indiscutível: José Mourinho trouxe muito ao futebol português. Mas não só a nível de títulos. Desde que o treinador setubalense chegou ao FC Porto e desatou a ganhar troféus, depois de passagens promissoras por Benfica e União de Leiria, muitos dos agentes do futebol português (dirigentes e jornalistas, acima de todos) desataram à procura do novo Mourinho. Para tal traçaram um perfil: passado nulo ou discreto enquanto jogador e estudos universitários na área do desporto, especialmente do futebol. De um momento para o outro, o “Modelo Vítor Manuel” (como eu gosto de chamar aos treinadores da velha guarda), com técnicos com passado enquanto jogador e com saber feito de experiência, de preferência acompanhados por um farfalhudo bigode (até isto se está a perder, com muita pena minha), passaram a estar fora de moda.

No entanto, o despedimento, no espaço de uma semana, de José Peseiro e de Carlos Carvalhal de dois dos maiores clubes nacionais, mostra que nada é linear, muito menos no futebol. Peseiro e Carvalhal são precisamente dois dos treinadores dos quais se esperava que dessem continuidade ao sucesso de Big Jose (assim mesmo, sem acento, coisa que os ingleses desconhecem). Os dois começaram a carreira de forma discreta: Carvalhal passou por Espinho, Freamunde, Vizela e Aves e Peseiro por U. Santarém, U. Montemor e Oriental. E os dois começaram a dar nas vistas em clubes de escalões secundários: Carvalhal conseguiu subir de divisão com Leixões e V. Setúbal e Peseiro com o Nacional, além de ter passado, sem sucesso, pelo Real Madrid, como adjunto de Carlos Queiroz.Ambos os dois, como diria o outro, tiveram a sua grande oportunidade na mesma altura, início da época 2004/05. Carvalhal no Belenenses e Peseiro no Sporting. Ambos os dois saíram sem honra nem glória, depois de falhados os seus projectos. Peseiro tinha como objectivo o título nacional e a vitória na Taça UEFA, que tinha a final marcada para Alvalade. Apesar de alguns tropeços pelo caminho, lá conseguiu chegar à semana decisiva com hipótese de cortar as metas na frente. Como se sabe, não conseguiu mais que um segundo lugar, na UEFA, e um terceiro, na Superliga. Esta época tudo correu mal, falhando logo dois dos quatro objectivos do Sporting e colocando outro (a Liga) em causa. Carvalhal teve um percurso parecido no Restelo. Os objectivos, sendo mais modestos, naturalmente, eram, ainda assim, ambiciosos. Classificação europeia e Taça de Portugal eram os sonhos a atingir. Como é sabido, nem um nem outro ficaram sequer perto de acontecer. Esta época, com um plantel reforçado, as expectativas eram ainda maiores. Depois de cinco derrotas consecutivas, uma das quais significou a eliminação da Taça, Carvalhal não tinha condições para continuar. Não deixa de ser irónico que o ex-defesa do Sporting de Braga tenha trocado Setúbal pelo Restelo devido à sua ambição de ganhar troféus e disputar provas europeias. Teve azar, o Vitória ganhou a Taça e foi à UEFA. Falta de paciência, às vezes, dá nisto, Carlos... (Claro que o Vitória está com a corda na garganta, mas mais uma Taça no museu e uma viagem a Itália já ninguém lhe tira).
Significará isto o fim da busca do Santo Graalinho (trocadilho idiota entre Santo Graal e Mourinho)? Será que falar em pressão alta, processo defensivo, processo ofensivo e periodização táctica chega para se ser um bom treinador? E Carvalhal e Peseiro são apenas os casos mais mediáticos. O que é feito de outros teóricos do futebol, como Luís Campos, Vítor Pontes e José Couceiro? Todos podem ser muito bons técnicos (no sentido de dominarem a técnica de treino), mas serão bons treinadores? Ou Mourinho terá algo mais: modo como motiva os jogadores, como estuda todos os pormenores dos adversários, como usa a imprensa para passar a mensagem que lhe interessa... Há que perceber que génios aparecem quando calha e o mais que se pode fazer é colher ensinamentos deles, nunca imitá-los.Já que falo de treinadores, faço aqui a minha homenagem pessoal a um dos meus técnicos-modelo. Ele já está na História do Futebol, apesar de fora das fronteiras dos países onde trabalhou não lhe ser dado grande valor. No fundo, para mim, ele é um Mourinho (não um sucessor, mas um antecessor, visto que anda nisto há mais de 30 anos). Não tem os estudos do treinador do Chelsea, mas em termos de motivação e agregação do grupo não lhe fica a dever nada. Chama-se Otto Rehhagel, actual seleccionador grego. Antes de rumar para o sudeste europeu, König Otto tinha feito trabalhos memoráveis em clubes de segunda linha do futebol alemão. No Werder Bremen, foi duas vezes campeão alemão (antes dele o clube só tinha um título), ganhou a Taça e a Taça das Taças, único título europeu do clube. No Kaiserslautern foi, em épocas consecutivas, campeão da II e da I Divisão alemães, algo de inédito naquele país e, possivelmente, no resto do Mundo. O único falhanço como treinador aconteceu, pasme-se, no Bayern Munique. Para curar a tristeza, assumiu o comando da selecção grega e foi o que se viu. Curiosamente, durante e após o Euro, muitos jornalistas portugueses acusaram-no do mesmo que José Mourinho tem sido acusado em Inglaterra: por um lado, muita arrogância, por outro, a sua equipa jogava um futebol nada atraente. Para mim, a Grécia mereceu inteiramente ganhar o Euro: uma equipa que vence Portugal (duas vezes), França e República Checa e empata com a Espanha (de quem tinha ficado à frente já na fase de qualificação) merece os maiores elogios. Não jogava um futebol tão atraente como Portugal, Rep. Checa ou Holanda? Pois não, se tentasse jogar teria perdido todos os jogos da primeira fase. Não nos esqueçamos que, entre 16 selecções, a Grécia era considerada a 15ª melhor (apenas a Letónia tinha menos prestígio). Para não falar nos ovos e nas omeletas, digo que com tremoços não se faz um arroz de marisco (tirando, claro, o Eusébio). Tal como Mourinho, Rehhagel sentiu na pele a inveja que provoca a extrema competência. Tal como Mourinho, deve ser para o lado que Otto dorme melhor...

7 Comments:

At 6:32 da tarde, Anonymous Anónimo said...

Caro Jorge, é verdade que depois da meteórica ascenção de Mourinho, todos procuravam outro igual. Mas Mourinho é realmente único.
Dos técnicos que o meu amigo refere, Carvalhal e Vítor Pontes (incluo este pk é o Zé que o diz) são os únicos que utilizam a periodização táctica como processo de treino! Os outro são pura tentativa de imitação sem sequer saberem do que estão a falar (talvez com excepção de Peseiro). Periodização táctica é um conceito muito muito recente. Não implica simplesmente trabalhar sempre com bola. Isso é Treino Integrado. Periodização Táctica é muito mais que isso!
Carvalhal vai, mais tarde ou mais cedo, acabar por ter sucesso num dos grandes!

"Será que falar em pressão alta, processo defensivo, processo ofensivo e periodização táctica chega para se ser um bom treinador?" - é óbvio que não! Ser treinador não é só dar treinos. Quanto a Luís Campos e Couceiro... Teóricos do futebol? Era uma piada, certo? Nem teoria nem prática. Simples zeros à esquerda!

 
At 6:34 da tarde, Anonymous Anónimo said...

Quanto a Otto Rehhagel e a vitória no Euro... Não comparemos a sorte que teve com o mérito das sucessivas vitórias de Mourinho! A prova é que quando se tratou de regularidade, ficaram de fora do Mundial!

 
At 1:21 da tarde, Blogger José Cavra said...

Há aqui muito para comentar caro Jorge.
Mourinho é único, sem dúvida. em jeito de brincadeira disse numa posta anterior, que teve o mérito de tornar a liga inglesa no campeonato mais entediante do mundo. Digamos que numa competição de regularidade é quase impossivel vencer uma equipa treinada pelo Jose (sem acento).
Peseiro, fez um trabalho interessante no Nacional da Madeira. No SCP falhou porque não teve "pulso" na equipa.
No jogo contra o FCP no Dragão, Rochemback, a quando da sua substituição mandou o treinador "apanhar no cú". Peseiro e a SAD não agiram... foi o começo do fim.
O SCP falha igualmente por não ter um plantel bem estruturado. ao nível da defesa não vejo soluções no banco.
Carlos Carvalhal foi uma surpresa. sempre pensei que se tratava de um grande treinador. No Restelo os sócios dizem que ele é um Bluf. não opino.
Luis Campos: já malhei demais no homem nos posts iniciais deste blog, mas... sabiam que venceu Mourinho por 2-0 pouco tempo antes do Porto se ter sagrado campeão europeu?
De Couceiro, amigos meus ligados ao FCP (eu não sou adepto do Porto) disseram-me que os treinos eram uma valente ..balda. que o homem não tem método.
Para finalizar, lanço uma questão, que tal José Gomes?

 
At 1:27 da tarde, Blogger José Cavra said...

Otto Rehhagel e a sua Grécia: sorte Rika? não podes ter sorte em 6 jogos seguidos?!! a Grécia era uma selecção talhada para jogar com equipas mais fortes. uma equipa muito forte defensivamente e que apostava no contra-ataque.
A Grécia venceu porque algumas selecções facilitaram. Falo da Itália de Trap e da insistência constante em Vieri e da França que insistou em Trezeguet, Henry e outros.
Quando chegamos a fases finais de mundiais ou europeus os treinadores têm que ter coragem e fazer alinhar os jogadores em melhor forma.
Oliveira pecou no Mundial de 2002 ao fazer alinhar Figo.
Scolari não teve a coragem de retirar Pauleta, então em péssima forma.

 
At 9:34 da tarde, Blogger André S. Machado said...

Mourinho... só há um meus amigos! Mourinho é único! O jogo psicológico, as técnicas de treino, a atitude, a motivação que dá aos seus jogadores... Refiro aqui que se diz que Mourinho, na época transacta, aquando do sorteio para a Champions, saltou de alegria quando lhe calhou a suposta "fava", o poderoso Barça! Sim... Mourinho tinha equipa para eles, mas que outro treinador se alegra por jogar com a equipa catalã?
São essas atitudes e a sua própria personalidade inigualável que fazem do Mourinho o melhor treinador do Mundo e um dos melhores de sempre!

 
At 9:43 da tarde, Blogger Tiago Gonçalves said...

"Para finalizar, lanço uma questão, que tal José Gomes?"

Caro amigo Cavra, o Zé Gomes é o Luis Campos versão 2.0: conseguiu, em Paços de Ferrreira,descaracterizar completamente uma equipa que estava muito bem estruturada pelo José Mota e, em Leiria, pouco trabalho mostrou a não ser uma equipa que era a pior do nosso campeonato, como teve várias vezes oportunidade de demonstrar. Será azar? Não acredito,neste caso.
Quanto ao Zé Mário, penso que dificilmente algum treinador conseguirá mudar o futebol em Portugal como o "Special One" o fez nos próximos ...30 anos. O único treinador português que revolucionou mentalidades e que pode entrar em comparação é José Maria Pedroto(Épocas douradas de Vitória de Setúbal,Boavista e Porto).
Carvalhal desenvolveu um trabalho muito positivo no Leixões e em Setúbal e sinceramente acredito que não se trata de um "bluff".

 
At 7:12 da tarde, Anonymous Anónimo said...

Ok, não se pode ter só sorte em 6 jogos seguidos. Mas como se explica a não ida da Grécia ao Mundial? Não se pode ter azar em 12 jogos seguidos...

 

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