Vitória
Eu sei que acontece todos os anos e eu já devia ter calo suficiente para não me indignar com isso, mas não consigo evitar: o Vitória de Setúbal voltou a abrir as pernas aos seus amigos do Porto. Desta vez nem tentou disfarçar; aos 6 minutos já perdia por 0-2. Isto depois de uma semana em que os dois capitães de equipa foram suspensos. É conhecido que o ambiente já estava minado há muito tempo, mas a explosão teve logo de acontecer nas vésperas da recepção ao dragão. Há coincidências fantásticas, não há? Quanto aos dois golos em seis minutos, fazem-me lembrar os relativamente recentes Salgueiros-FC Porto. E sabe-se onde está - ou não está - o Salgueiros, hoje em dia. Talvez o futuro do Vitória não seja muito diferente.
Quando eu confronto os meus amigos vitorianos com mais uma derrota frente ao Porto, eles encolhem os ombros e dizem, resignados: “Este jogo não era do nosso campeonato...”. Eu admito que o Porto é mais forte que o Vitória e que em 10 jogos no Bonfim ganhe seis ou sete. Mas também espero que o Vitória ganhe um ou dois. Acho que é razoável, até porque nestes últimos 10 anos o Porto já teve épocas de crise. Caramba, eu já vi o Porto perder na Amadora, em Faro, em Campo Maior, em Santo Tirso...
Já aqui escrevi sobre um dos problemas do futebol português: o facto de haver muito poucos adeptos dos clubes pequenos. Praticamente não há vitoriano que também não tenha uma costela sportinguista, benfiquista ou portista. E esta última está a crescer cada vez mais, segundo me apercebo. Isto prova que as pessoas gostam de ganhar, mais do que gostam de um clube. Quando se apercebem que a sua primeira escolha dificilmente ganhará algo, apoiam um emblema mais forte.
Eu sou, como já escrevi montes de vezes, adepto ferrenho do Eintracht Frankfurt. Mesmo a 2500 quilómetros de distância acompanho o dia-a-dia do clube. Isso inclui navegar regularmente em fóruns de adeptos. E cheguei à conclusão que, mesmo sem ganhar o campeonato há 47 anos, uma prova europeia há 26 e a taça da Alemanha há 18, os adeptos do Eintracht não precisam de apoiar também o Bayern, o Bremen, o Dortmund ou o Schalke para poderem ganhar alguma coisa. Porquê? Porque esses são clubes rivais e os adeptos do Eintracht acreditam que mais cedo ou mais tarde vão voltar a lutar com eles pelos títulos. E eu acredito também, por isso, apoio um clube que muita gente, desconhecedora, considera pequeno.
Em Portugal, conhece-se a situação. Os adeptos do Belenenses não passam um dia sem proclamarem que são o quarto grande. Mas as assistências no Restelo são comparáveis, em relação a Inglaterra e à Alemanha, às da quarta divisão para baixo. O Boavista, que foi campeão há cinco anos e que teve excelentes presenças europeias recentemente, também tem uma assistência ridícula nos jogos em casa. O Braga, que tem sido o quarto grande no campeonato nos últimos três ou quatro anos, também não consegue ter assistências a condizer, e quando o Benfica vai lá jogar nota-se que o Braguismo é apenas a segunda crença da maior parte daquela gente.
E depois temos o Vitória (de Setúbal, pois o de Guimarães é o único clube que consegue desmentir o que estou a afirmar). O Vitória sadino representa uma das maiores cidades do país. É um clube sem rivais à altura do Tejo para baixo. Isso podia ser uma vantagem, tanto em termos de captação de talentos, como de adeptos. Nada disso tem acontecido. Os talentos, com os centros de estágio de Benfica e Sporting nos arredores, já não têm razão para dar preferência ao Vitória. E os adeptos também acabam por fugir, pois Setúbal nunca foi uma cidade muito bairrista e cada vez o é menos. Sem dinheiro, com um estádio muito antiquado, com um plantel que vive das sobras dos grandes, com cada vez menos adeptos, o Vitória caminha a passos largos para, senão a extinção, para uma existência quase anónima.
Eu recordo-me do tempo, há não mais de 15 anos, em que havia cinco equipas séniores em Setúbal: Vitória, Comércio e Indústria, Marítimo, Bairro da Liberdade e 1º de Maio. Os três últimos desapareceram do mapa, a nível sénior. O Comércio, que ainda há poucos anos era uma boa equipa de terceira divisão, anda agora num sobe-e-desce entre a primeira e a segunda distrital. Nem por isso o Vitória ganhou mais adeptos. Pelo contrário, a cidade de Setúbal parece cada vez mais divorciada do futebol. Pelo menos do local, pois aos sábados à tarde os cafés enchem-se para ver o Chelsea de Mourinho. Este sim, é o maior clube setubalense da actualidade.
Tudo isto leva-me a um tema sobre o qual também já escrevi. A médio prazo, a única forma de manter os nossos clubes grandes num bom nível competitivo seria participarem numa outra liga. Tanto pode ser a superliga europeia, a liga espanhola ou uma liga que já existiu em projecto e que reuniria os melhores clubes das ligas portuguesa, holandesa, belga e escocesa, que, no fundo, também se batem com problemas parecidos com o nosso.
PS - Eu sou um crítico feroz da péssima Imprensa desportiva que temos, em particular da Bola, também conhecida por Bolha, porque sendo o jornal mais antigo e que atingiu maior prestígio, é aquele onde se nota uma maior descida de qualidade e uma tendência mais acentuada para o mau gosto. Mas não pude deixar de aplaudir quando tomei conhecimento, hoje, que Jorge Valdano vai começar a escrever para o jornal aos sábados. Num panorama de péssimos colunistas que têm invadido a Comunicação Social portuguesa, neste caso a desportiva (Miguel Sousa Tavares é para mim o maior exemplo, pela fama que atingiu enquanto bojardeiro), é reconfortante saber que ainda há lugar para quem sabe de futebol, quem é do futebol, que ocupou vários cargos no futebol, não caído de páraquedas, como a maior parte deles, mas alguém que foi grande nos relvados e continua a ser fora deles. Seria tão bom que este fosse o primeiro passo no caminho da redenção da Imprensa desportiva... Mas já não tenho idade para ilusões.
6 Comments:
Pena que as coincidências da época transacta passado nunca tenham sido referidas.... mas claro... naquelas circunstâncias foi para ajudar o Vitória.....
A Leonor Pinhão é um caso raro de sucesso, a sua veia jornalística contra o F.C.P já lhe valeu uma medalha de mérito e honras de estado.
PS: O José Fonte joga onde?
O José Fonte joga no Estrela da Amadora.
Mas já agora, por onde anda o Bruno Vale?
O Bruno Vale está na U. Leiria.
Talvez o Porto devesse ter contratado o GR do vitória e algum defesa central. E se possível fariam uma espera no aeroporto a algum familiar ou amigo desse GR.
Eu acho que essa necessidade de torcer por um grande é consequência do amadorismo que as equipas pequenas apresentam. Por exemplo, não acredito que a diferença entre as infra-estruturas do Eintracht e do Bayern seja tão grande como aquele fosso que separa os estádios do Vitória e do Sporting. Se eu vou a um jogo num estádio velho, feio, sem animação antes e depois dos jogos e com espectáculos(?!) de futebol muito fraquinhos será que terei alguma vontade de apoiar aquele clube? Se não tenho nenhum prazer a ver aquela equipa para quê gastar o meu tempo?
O Vitória representa um caso mais flagrante porque não tem desculpa para ser tão pobrezinho como é. Comparado com Leiria, por exemplo, acho que há muito mais pessoas que sentem o clube da terra. Mas em termos da própria estrutura a União é mais estável e, pelo menos quanto parece, mais influente(se conseguiram um estádio novo...). Com a construção de um recinto mais moderno, mais pequeno e bem situado(Vale da Rosa não, por amor de Deus) acredito que o ânimo setubalense pelo desporto aumentasse. Mas para isso também é necessária estabilidade num clube com poucos traços de profissionalismo...
Já que abriram assim as pernas tão à vontade, o capitão, Bruno Ribeiro escusava de ter tentado partir a perna ao Lucho.. penso eu de quê?
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