15 janeiro, 2007

Ser...

Há uns tempos, o meu amigo Porfírio fez-me uma pergunta. Recordo-me que na altura não lhe dei nenhuma resposta por aí além e a conversa não foi longe. Mas nos entretantos reflecti um pouco sobre o tema e cheguei a algumas conclusões filosóficas. Não tenho a presunção de serem conclusões universais, mas são pelo menos pessoais da minha pessoa. A pergunta era mais ou menos esta: “Achas que nós, adeptos de futebol de clubes diferentes, somos assim tão diferentes uns dos outros?”. A verdade é que, depois de pensar um pouco, normalmente durante o banho mensal, acho que sim, somos diferentes. Vou tentar explicar as minhas ideias, de uma forma tão concisa quanto possível. Como não posso analisar o que é ser adepto de todos os clubes nacionais, vou tentar analisar sobretudo o que é ser adepto dos três grandes.

Ser benfiquista


Até aos meus 7/8 anos dizia que era benfiquista. Não ligava nenhuma ao futebol, mas a maioria dos meus amigos eram lampiões e eu também pensava que era. Depois mudei para o outro lado da Segunda Circular. Hoje não me imagino como benfiquista. Na minha opinião os benfiquistas sofrem de arrogância de gigantismo. Não duvido que têm mais adeptos e mais títulos, mas não me agrada a conversa de que são a medida de todas as coisas. As tretas do Glorioso e da Catedral, que até a Comunicação Social adoptou, mostram parte dessa arrogância. Outra manifestação acontece quando proclamam que o Benfica há-de ser sempre o maior, independentemente do que o futuro traga. A frase “se o Benfica acabar, o futebol português também acaba” é outro marco lampiónico.

Há uns dez anos os benfiquistas gabavam-se de ter mais campeonatos que todos os outros juntos. Hoje em dia essa questão já nem se coloca. Também se orgulhavam de ter mais títulos internacionais que os outros, mas também nisso já estão a perder. Alguns ainda tentam atirar a Taça Latina para o barulho, como se fosse um título europeu, mas não pega. Outros desvalorizam as Supertaças, competição onde têm menos títulos que Porto e Sporting. Agora, à falta de resultados, temos o Guinness. O Benfica é o clube do mundo com mais sócios - até num forum na “Kicker Online” apareceu um lampião residente em Estugarda a chagar os pobres adeptos alemães com isso. Como se não soubesse(mos) que na Alemanha e em Inglaterra, os dois países com melhores assistências nos estádios, os sócios têm muito menos importância do que no sul da Europa. E depois temos o caso-Eusébio, que terá de ser sempre o melhor jogador português de sempre, mesmo que alguns façam melhor que ele.

Mas há que dizer que essa arrogância gigantista não é exclusiva do Benfica. Por isso eu não gramo clubes como o Real Madrid, a Juventus, o Bayern, o Liverpool, o Flamengo ou o Boca Juniors, entre outros. Quem ouve adeptos destes clubes a falar acredita que se tratam de entidades quase divinas, em que ninguém pode tocar, mesmo que os resultados em determinada altura contrariem essa grandeza. É óbvio que ser adepto do Benfica, ou dos outros clubes mencionados, é mais fácil: estão em maioria, têm mais títulos para mostrar, se comprarem o jornal ou ligarem a TV sabem que vão ter mais espaço que os outros, etc. Mas, curiosamente, em cerca de 100 anos de futebol em Portugal, o Benfica só dominou 20. Até aos anos 50 o Sporting tinha mais títulos (18 contra 10 no Campeonato de Lisboa, 4 contra 3 no Campeonato de Portugal e estava também em vantagem no campeonato nacional). Depois vieram os anos 60 e 70 que foram efectivamente dominados pela águia, e foi aí que se ganharam muitos adeptos. A partir dos anos 80 esse domínio foi sendo perdido para o FC Porto.

Outro aspecto é o orgulho da dimensão popular do clube. O Benfica é o clube do povo, do garrafão e do coirato, em suma, é um clube com uma vertente pimba muito pronunciada. É o clube onde se vê uma senhora a chorar de orgulho depois do Benfica ter eliminado o PAOK nos penalties, como se tivesse ganho a Liga dos Campeões. Onde se vê um senhor de muita idade chorar de alegria por ver o nome do clube no Guinness. Pode ser pitoresco, mas não acho piada a esse estado de alma, “seremos sempre os maiores por mais fundo que batamos”. Em resumo, penso que essa arrogância de gigantismo eterno se encontra apenas no Benfica, por isso penso que ser benfiquista não é igual a mais nada.

Ser portista


Ser adepto do FC Porto até aos anos 70 era um acto de coragem. O Kataklinsmann Sénior, por exemplo, tornou-se portista nos anos 50, por isso também deve ter penado muito, enquanto adepto. Nos últimos 20 anos tudo se tornou diferente. O Porto tornou-se no clube mais bem sucedido do futebol português e, do nada, começaram a surgir adeptos do FêQuêPê. Pessoas que eu não sabia sequer que gostavam de futebol, um dia acordaram com o dragon no coração. Ou seja, hoje em dia é muito mais fácil ser adepto do Porto do que de outro clube em Portugal. Há uns meses a “FHM” publicou uma reportagem sobre pessoas que mudaram de clube enquanto adultos. E 70 a 80% dessas pessoas mudaram precisamente do Benfica para o Porto. O que confirma a minha teoria de que a paixão por ganhar é maior do que a paixão pelo clube.

Há umas semanas Hélder Postiga deu uma entrevista a “O Jogo” onde dizia que os adeptos portistas eram muito mais exigentes do que os benfiquistas ou sportinguistas e que não tinham problemas em mostrá-lo aos jogadores. Acho isso uma situação perfeitamente normal. Se grande parte dos adeptos portistas só descobriram a sua paixão devido às vitórias do clube, é normal que não gostem nada de perder. Nos últimos anos também surgiram muitos novos adeptos do Lyon e do Chelsea. Compreende-se, o sucesso traz adeptos. Mas quando um clube está tão dependente dos sucessos para atrair paixão, corre muitos riscos. Tenho a certeza absoluta de que se um dia o Porto voltar a ser o que era até aos anos 70, uma quantidade enorme de adeptos fugirá a sete pés do Dragão. Resumindo, enquanto os benfiquistas consolam-se com a “verdade absoluta” de serem um colosso eterno, os portistas só se consolam com vitórias atrás de vitórias. Por um lado é bom haver sede de vitórias. Por outro quando a sede é muita e as vitórias deixam de aparecer, muitos vão matá-la noutro lado.

Ser sportinguista


Eu tornei-me sportinguista no período mais complicado possível. Estávamos em 1984 e mal sabia eu que teria de esperar 16 anos para saborear o primeiro título de campeão. Os meus colegas Mandamil e Beckenbauer, bem mais jovens começaram a sofrer quando o jejum já era enorme. Por outro lado, esperaram menos para verem o caneco em Alvalade. Passar tantos anos a ver o sucesso fugir, a ouvir piadas constantes sobre o meu clube e inclusivamente a ler que o Sporting estava a ficar mais perto do Belenenses do que do Benfica e do Porto, em termos de dimensão, não foi fácil, ainda por cima quando sou um adepto apaixonado de futebol e não apenas um curioso de fim-de-semana. Mas sinceramente nunca tive vontade de mudar de clube ou simplesmente de me borrifar para o futebol (OK, durante a era-Peseiro pensei nisso, mas não fui capaz).

Não sei se ser sportinguista é ser mais dedicado e fiel que os outros. Por um lado não temos a mania de grandeza do Benfica, por outro não somos tão dependentes das vitórias como os portistas. A verdade é que mesmo com quase 30 anos de quase secura de títulos, não se verificou grandes alterações no sportinguismo. As assistências no estádio estão ao nível das dos rivais e o número de sócios continua razoável, tendo em conta que não se fez nenhuma campanha recentemente. O que se pode dizer então dos sportinguistas, em comparação com os seus rivais? Acho que um facto positivo e um negativo: por um lado são mais razoáveis e mais pacientes, por outro são também mais conformados com o destino do clube, seja ele bom ou mau. Pessoalmente, gostando muito de ganhar, tenho sobretudo simpatia por clubes com características semelhantes ao Sporting, isto é, que variam muito entre momentos de glória e outros de desgostos profundos. Tudo isso mantendo sempre a fidelidade dos adeptos. Por isso sou fã de clubes como o Eintracht Frankfurt, o Atlético de Madrid, o Inter, o Saint-Étienne, o Newcastle... Podem chamar de masoquismo, eu chamo paixão pelo futebol e estar preparado para subir às nuvens, mas, sobretudo, para descer bem ao fundo do poço.

Nem tudo é perfeito no Sporting e há certas coisas com as quais não me identifico. Por um lado não sou rico nem monárquico, duas condições a que o Sporting normalmente é associado. E não pensem que não lamento, pelo menos a primeira condição. De resto, não gosto de ouvir os meus consócios dizerem que “somos diferentes”. Para já, é verdade, como tento demonstrar nesta longa posta. Mas sei que a intenção é dizerem “somos melhores”. Eu gosto de ser sportinguista, mas não me considero melhor pessoa por isso. Também não gosto quando se fala em futebol e os sportinguistas dizem que somos o segundo maior clube da Europa em termos de títulos nas várias modalidades, a seguir ao Barcelona. Mudar de assunto não abona em nosso favor. Prontos, não somos perfeitos.

Ser adepto

Um dos problemas do futebol português, como eu me farto de vincar, é de haver paixão sobretudo por ganhar. Por isso aqui em Setúbal sempre houve muitos pseudo-vitorianos que afinal gostavam mesmo é do Benfica. Nos últimos anos tenho vindo a descobrir que afinal têm um fraquinho é pelo Porto. Nunca mais hei-de esquecer um jogo da III Divisão alemã, em Agosto de 2004, entre o Fortuna Düsseldorf e o Eintracht Braunschweig. São dois clubes que já foram campeões alemães, mas que entretando caíram nas profundezas dos campeonatos nacionais. Mas estavam quase 7000 espectadores num ambiente frenético. No final, ao viajar de metro, deparei com centenas de jovens adeptos do Fortuna, que festejavam a vitória como se tivesse sido um título. Pensei: “Chiça, num clube que já foi campeão, festejam assim uma simples vitória na III Divisão?”. Isto, meus amigos, é ter paixão pelo futebol e por um clube, independentemente do destino que este tiver. Comparado com isto, ser sportinguista não é assim tão doloroso.

Com isto espero ter respondido à questão do caro Porfírio. Sim, somos todos diferentes. Um adepto do Fortuna Düsseldorf não pode ter os mesmos sonhos, enquanto adepto, que um do Bayern Munique. Tal como um do Atlético (se ainda houver mesmo adeptos do Atlético) não pode ter os mesmos de uma adepto do Benfica. E só por isso merecem toda a consideração e, de certa forma, inveja, por estarem dispostos a levar uma vida de sofrimento (futebolísticamente falando) em nome de uma paixão.

10 Comments:

At 8:11 da tarde, Blogger Joao said...

Bom post. Acho que todos os adeptos estao bem caracterizados. Infelizmente acho que iras receber muitas respostas, a maioria nada construtivas, porque a maioria dos adeptos nao teem uma opiniao intelectualmente isenta de si proprios e do seu clube.

 
At 9:52 da tarde, Blogger Jota said...

Esta posta foi escrita sob o ponto de vista de um sportinguista, não pretendo ser imparcial. Se eu achasse que os benfiquistas eram melhores adeptos que os sportinguistas, provavelmente seria desse clube. Claro que é difícil definir um padrão exacto de adepto, mas há características que os distinguem. Isso passa-se em todos os grupos (portugueses vs espanhóis, católicos vs protestantes, sociais-democratas vs comunistas e também benfiquistas vs sportinguistas), por muito que as pessoas por vezes não se revejam na forma como são retratadas. Mas se isto der origem a um debate interessante, tanto melhor, não tenciono ser dono da verdade.

 
At 9:05 da manhã, Anonymous Anónimo said...

Sempre me ensiram que a lealdade é uma das maiores provas de amor, nos bons e maus momentos, e os Sportinguistas estão sempre com o seu clube, nos bons e maus momentos sem descurar uma atitude crítica e real dos problemas da instituição. Vive-se do passado, mas também do presente. Ao contrário de outros que se apegam às conquistas de passados longíquos (que devem ser lembradas), mas não permanentemente endeusadas como se fossem conquistas de hoje.Também existem outros que vivem dos sucessos recentes, mas esquecem o seu passado.
Por isso tenho orgulho de ser do Sporting, porque apesar de tudo ainda somos mais diferentes!

 
At 9:18 da manhã, Blogger José Cavra said...

Jorge mete uma coisa na cabeça, ninguém fez melhor dq Eusébio.
Dos 20 títulos de 20, vários sao super-taças... e nakele tempo nao havia disso.

 
At 9:28 da manhã, Blogger Ricardo G. fmshark said...

lololo

acho uma competa palhaçada o que disseste...fala mas é da merda do teu clube e deixa o benfica em paz, nós somos o clube do povo vcs são o clube dos gays...por isso venha o garrafão mde vinho e o courato enquanto que para ti venham pixotas né??
tás com azia eu compreendo se a minha equipa jogasse como a tua jogou eu tb ficava fdd.
para a semana já estas no lugar que te compete...3º!!!

 
At 10:51 da manhã, Anonymous Anónimo said...

Um comentário para o comentário de fmshark:

 
At 12:24 da tarde, Anonymous Anónimo said...

Jorge,

Sem beliscar a qualidade e o interesse do teu post, acho que não acrescentaste muito ao que já me havias dito.

Todos reconhecemos diferenças entre os adeptos, mas mantenho que, em muitíssimos aspectos, não somos assim tão desiguais.

Há uma massa essencial nos adeptos dos três grandes portugueses. Especialmente entre nós, benfiquistas e sportinguistas.

Somos sectários, inchamo-nos com momentos e jogadores pouco melhores que razoáveis, somos exagerados e impacientes, gozamos a desgraça alheia, etc.

Por isso me irritam os ódios ao Real Madrid e ao Benfica, sustentados quase politicamente num falso sentimento anti-império que desagua, por regra, em declarações de amor a clubes nada pequenos (Barcelona e SCP ou FCP).
Pela razão invocada, deveria, em coerência, eleger-se como clubes do coração equipas como o Salamanca ou o Estrela da Amadora.

Ainda assim, aceito que o gigantismo e a exigência dos benfiquistas seja ligeiramente superior aos dos sportinguistas. Admito-o, mas só nessa estrita medida. Ligeira. Muito ligeira, até porque não acredito no “looser fiel” como um exclusivo (estético) dos sportinguistas. Mal do Benfica se nos onze anos de fomeca quase total não contasse com animais desse porte entre os seus.
A estética da derrota está toda nesta imagem - http://www.poster.net/dean-james/dean-james-picture-walking-on-broadway-3700010.jpg- e não consta que o senhor da fotografia tivesse sido um apaniguado sportinguista.

 
At 2:11 da tarde, Blogger José Cavra said...

O Jorge foi um nadinha faccioso!
Há q dizê-lo com frontalidade.
Isso dos Sportinguistas serem diferentes dos outros... tem mto q se lhe diga.
A Sra (com todo o devido respeito) q canta o hino do SCP é bem pirosa.

 
At 2:38 da tarde, Anonymous Anónimo said...

Bem sei que o timing não é o mais correcto, mas há uma posta do fmshark de teor bastante ofensiva em relação a adeptos do Sporting, e que nada contribuem para o debate de ideias construtivas e baseadas no respeito mútuo que deve prevalecer entre os blogueiros deste blog, independentemente das suas ideologias clubísticas, políticas ou até mesmo das suas orientações sexuais.Quero com isto dizer que não nos ofende o facto de nos chamarem gays ou seja lá o que for, é a forma agressiva, homofóbica, e sem argumentos válidos para as discussões em questão. Será que todos os adeptos do Benfica são heterossexuuais? Será que todos os adeptos do Benfica são mal educados como o fmshark? Será que todos os adeptos do Benfica são Homofóbicos?Creio que não.
Já agora aproveito para referir que o Benfica na próxima época segundo o jornal Record vai apresentar um equipamento alternativo em tons de rosa.Sendo o rosa muitas vezes associado às comunidades gay( inclusivé se não estou em erro existe uma associação gay chamada Panteras Rosa pergunto ao fmshark qual será a sua atitude se por acaso alguns energúmenos sejam eles de clube for fizerem trocadilhos com o Pantera Negra? Dou como exemplo provável a designação de Panteras Côr de Rosa à equipa do Benfica da próxima época quando apresentar o equipamento em questão. Será que o SLB passará a ser designado como o clube dos gays com os quais o nosso amigo não se identifica?
Que me perdoem esta posta, os blogueiros residentes pelos quais eu tenho enorme consideração apesar dalguns pontos de vista divergentes e convergentes como é natural no debate de ideias. Não é isso que se pretende? Não respondo por mim, porque acho que nem devia comentar, apenas defendo todas as pessoas que se possam considerar descriminadas com este tipo de comentários.Não sou advogado de defesa de ninguém, mas tenho como principio o respeito pelos meus semelhantes sejam gays, benfiquistas ,portistas, negros, brancos , amarelos etc.

 
At 9:03 da tarde, Blogger José Cavra said...

llllooooolllllllllll!
Estiveste bem Heidi.
lllllllloooooooolllllllll

 

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